A nudez de Noé – o mundo novo com homens velhos. Gn 9. 20-29

Introdução:
Mesmo após o dilúvio, vemos que o desígnio do homem é mau desde a sua mocidade (Gn 8.21). Já na primeira família da reconstrução da humanidade, percebemos essa natureza pecaminosa presente. A Bíblia não é um livro de heróis hollywoodianos, mas sim de pessoas reais que repetem insistentemente o pecado. Até o momento, vimos o exemplo de Noé de forma positiva; hoje, vamos observar seus tropeços.
Estrutura:
- Noé planta uma vinha
- Cam desonra o pai
- As bençãos e maldições de Noé
- Aplicações
· Noé planta uma vinha
Sendo Noé lavrador (v. 20), ele inaugura a viticultura, fazendo com que, no novo mundo, a terra passe a produzir seus frutos. Contudo, como a presença do pecado está na natureza humana, logo no versículo seguinte vemos a capacidade do homem em deturpar todas as bênçãos que o Senhor oferece.
Noé, ao beber vinho, embriagou-se e se pôs nu dentro de sua tenda (v. 21). Duas questões são importantes para analisarmos: primeiro, o estado em que Noé se encontra. Embriagado, deita-se nu; em Noé vemos um exemplo claro de como o homem é capaz de fazer mau uso das provisões do Senhor, transformando o que é bom em mau. Segundo, a consequência de sua embriaguez é a indecência.
Em Habacuque 2:15, vemos o profeta trazendo uma repreensão contra aqueles que oferecem bebida ao próximo com más intenções, visando embriagá-lo para contemplar sua nudez. A bebida forte, entre tantas reprovações, traz a indecência dos homens.
· Cam desonra o pai
Cam entra na tenda e contempla seu pai nu. Há algumas interpretações que justificam a condenação de Noé contra a sua descendência. Uma delas é a mais perceptível na narrativa: Cam escarneceu de seu pai por conta de sua condição de nudez, o que trouxe desonra para Noé e, consequentemente, seu furor.
Outra interpretação leva a entender que Cam pode ter olhado para seu pai com voyeurismo, ou seja, de forma indecente e sem consentimento. Aqueles que entendem dessa forma compreendem que Cam pode ter sentido prazer na nudez do seu pai. Se isso for verdadeiro, temos em Cam um início de uma depravação sexual que culminará nos eventos de Sodoma. No entanto, ao que parece, não há relatos suficientes para tal afirmação.
Como já vimos em Habacuque, a embriaguez acaba sendo associada à imoralidade. No caso de Cam, possivelmente homossexual. De qualquer forma, justifica-se as maldições proferidas por Noé.
No versículo seguinte, vemos Sem e Jafé com uma atitude completamente diferente de seu irmão. Eles, de rostos virados e de costas, cobrem o pai, honrando-o mesmo em sua vergonha.
· As bençãos e maldições de Noé
Provavelmente, nesse momento, Canaã já havia nascido e talvez fosse adulto; por isso, a maldição proferida por Noé não foi contra Cam, mas contra seu filho ou sua descendência. Ademais, como o filho desonrou o pai, a maldição sobre os descendentes de Cam também seria uma desonra sob medida.
As duas bênçãos proferidas aos irmãos que honraram o pai refletem, mais uma vez, a história de Adão: o primeiro filho desobediente e perverso, rejeitado por Deus por conta de sua maldade; o segundo filho, justo e piedoso; e o terceiro filho, que acompanha ou recebe os mesmos benefícios do segundo. Veja: Caim foi o filho amaldiçoado por Deus; Abel, o piedoso assassinado; e Sete, que vem depois, substitui e recebe as bênçãos de Abel ao restaurar o culto ao Senhor.
Semelhantemente, Cam é o filho desobediente que recebe maldições de seu pai, ofendido por sua rebelião; Sem é abençoado pelo pai, e Jafé compartilha da herança de seu irmão.
Nos versículos 28 e 29, conclui-se a história iniciada em Gênesis 5:32, sendo o Dilúvio um grande parêntese importante para que toda a humanidade conheça suas origens. De modo semelhante, no capítulo 10, vemos a continuidade da genealogia iniciada no capítulo 5.
· Aplicações
A forma como se encerra a história de um dos principais pais da fé possui um sabor agridoce. Por um lado, temos o homem obediente a Deus, a quem foi confiada a continuidade do projeto redentor da humanidade. Ele seguiu rigorosamente cada uma das instruções divinas e foi o destinatário de uma aliança perpétua que podemos testemunhar até os dias atuais.
Por outro lado, esse herói da fé demonstra que ainda carrega consigo as marcas do pecado: um coração inclinado ao mal e a capacidade de transformar as bênçãos concedidas por Deus em maldição para si mesmo.
É somente em Cristo que seremos definitivamente curados dessa marca do pecado. Enquanto isso, devemos buscar uma vida de vigilância, aperfeiçoamento e santificação, para que o fim de nossas vidas não traga desonra às nossas famílias nem ao nome do Senhor. Devemos ser um povo que, em tudo — até mesmo em nossa morte —, glorifique o nome de nosso Senhor e Salvador. Cabe a cada um de nos guardar a nossa nova aliança com Deus por meio de Cristo obedecendo sua Palavra, contextualizando, Paulo nos orienta: E não vos embriagueis com vinho, em que há contenda, mas enchei-vos do Espírito Ef. 5.18